Animada pelos sentimentos despertados pelos post sobre meu pai, a Renata escreveu lindamente lá no blog dela sobre o seu pai. E foram interessantes os comentários ao que ela escreveu, todo mundo se identificando um pouco - uns mais outros menos reconciliados com essas pessoas e esses personagens que podem ser tão decisivos (pro bem e pro mal) na vida da gente.
Me chamou a atenção um comentário em especial, que dizia ser uma importante descoberta essa de perceber que os homens da geração de nossos pais eram confusos, um pouco meninos e não sabiam bem o que fazer conosco.
Meu marido é um "tantinho" mais velho que eu (está mais próximo em idade e geração à minha mãe do que de mim). No dia em que nos conhecemos, conversamos longamente, ele me contando de sua separação, da falta que lhe faziam as filhas, do imenso esforço em não perder o convívio com elas...Essa certamente foi uma das coisas que me seduziram nele: essa clareza de não perder de vista seu papel de pai só porque o casamento tinha acabado.
Algumas vezes me peguei pensando quanta diferença fazia se separar há 20 anos (quando isso não era comum) e há 10. É pouco tempo, mas estamos separados por um abismo no que se refere às representações de família, casamento, indivíduo...
Separar-se - ou ser filho de pais separados - era um estigma, motivo de pena ou desculpa para maus comportamentos. Era razão para ser mandado para a terapia, para ser discriminado na escola... Ser separado era sinal de fracasso pessoal, da incapacidade de conciliar as diferenças ou egoísmo frente ao desamparo dos filhos. Era partindo dessa constatação que eu entendia, em parte, o comportamento do meu pai logo após a separação.
E por isso também a minha admiração pelo Edu era maior: eu achava que ele era muito moderno, muito cosmopolita nessa coisa de distinguir os papéis e saber manter-se perto; de não ter suportado a idéia de se afastar para "se resolver" com suas dores em nenhum momento. A Bia e a Jú sempre foram filhas dela e ponto. Sem dúvida; sem nem uma sombra de dúvida.
Mas vejam: isso não o torna menos desajeitado em seu amor por elas. Ele não tem nada de menino, é super adulto. Ele não se ausenta - pelo menos não fisicamente. Mas não sabe bem o que fazer com essas duas meninas (na verdade, hoje uma mulher e uma menina-moça), não sabe como chegar perto delas... Podem ser os ecos nipônicos em sua alma; podem ser os reflexos de geração: não sei bem se importa. O fato é que ele é desajeitado e provavelmente elas têm em relação a ele sentimentos tão ambíguos quanto o que nós temos por nossos pais - essa mistura de admiração e distanciamento, de amor e ódio, de aconchego e dureza.
Acho que as dores todas aparecem - em relação a pais, em relação a mães - porque a gente sempre espera (mesmo quando cresce e descobre que eles não são super heróis) que eles nos cuidem, que saibam o que fazer, que nos orientem, que nos protejam...A gente às vezes se relaciona com o papel, e não com a pessoa. Ou nos relacionamos com aquela imagem de pai e mãe que nos ficou da infância, com dificuldades de perceber que mudamos nós, mudaram eles.
Talvez seja por isso que eu aposto numa relação com o Rô que às vezes nem sei bem se é de mãe e filho. Somos nós dois, nos reconhecendo o tempo todo. Isso não significa deixar de cuidar dele, de mostrar a ele o certo e o errado, nem me recusar a oferecer a ele alguns contornos claros sobre o que é a vida. Significa sim um olhar atento, o reconhecimento junto com ele que de vez em quando erro, perco a cabeça, não sou perfeita, enfim. Mas estou aqui, com ele, pro que der e vier.
É tão difícil. O mais comum é se sentir desajeitado diante dos outros, tanto mais diante dos seres pequeninos que nos amam, nos olham tão de perto e esperam de nós toda certeza do mundo. Nessas horas, é mais fácil ser um papel - nos aproximarmos do que imaginamos que são as mães, os pais, e agir como se soubéssemos exatamente o que estamos fazendo. Mesmo que na maior parte das vezes não saibamos. Mesmo que vira e mexe a gente se sinta tão criança quanto o filho que espera de nós uma resposta.
Tem jeito de não ser desajeitado quando a gente contém no corpo tanto amor?
Imagem: http://familias-online.blogspot.com/2007/05/famlia-ontem-hoje-amanh-sempre.html
Me chamou a atenção um comentário em especial, que dizia ser uma importante descoberta essa de perceber que os homens da geração de nossos pais eram confusos, um pouco meninos e não sabiam bem o que fazer conosco.
Meu marido é um "tantinho" mais velho que eu (está mais próximo em idade e geração à minha mãe do que de mim). No dia em que nos conhecemos, conversamos longamente, ele me contando de sua separação, da falta que lhe faziam as filhas, do imenso esforço em não perder o convívio com elas...Essa certamente foi uma das coisas que me seduziram nele: essa clareza de não perder de vista seu papel de pai só porque o casamento tinha acabado.
Algumas vezes me peguei pensando quanta diferença fazia se separar há 20 anos (quando isso não era comum) e há 10. É pouco tempo, mas estamos separados por um abismo no que se refere às representações de família, casamento, indivíduo...
Separar-se - ou ser filho de pais separados - era um estigma, motivo de pena ou desculpa para maus comportamentos. Era razão para ser mandado para a terapia, para ser discriminado na escola... Ser separado era sinal de fracasso pessoal, da incapacidade de conciliar as diferenças ou egoísmo frente ao desamparo dos filhos. Era partindo dessa constatação que eu entendia, em parte, o comportamento do meu pai logo após a separação.
E por isso também a minha admiração pelo Edu era maior: eu achava que ele era muito moderno, muito cosmopolita nessa coisa de distinguir os papéis e saber manter-se perto; de não ter suportado a idéia de se afastar para "se resolver" com suas dores em nenhum momento. A Bia e a Jú sempre foram filhas dela e ponto. Sem dúvida; sem nem uma sombra de dúvida.
Mas vejam: isso não o torna menos desajeitado em seu amor por elas. Ele não tem nada de menino, é super adulto. Ele não se ausenta - pelo menos não fisicamente. Mas não sabe bem o que fazer com essas duas meninas (na verdade, hoje uma mulher e uma menina-moça), não sabe como chegar perto delas... Podem ser os ecos nipônicos em sua alma; podem ser os reflexos de geração: não sei bem se importa. O fato é que ele é desajeitado e provavelmente elas têm em relação a ele sentimentos tão ambíguos quanto o que nós temos por nossos pais - essa mistura de admiração e distanciamento, de amor e ódio, de aconchego e dureza.
Acho que as dores todas aparecem - em relação a pais, em relação a mães - porque a gente sempre espera (mesmo quando cresce e descobre que eles não são super heróis) que eles nos cuidem, que saibam o que fazer, que nos orientem, que nos protejam...A gente às vezes se relaciona com o papel, e não com a pessoa. Ou nos relacionamos com aquela imagem de pai e mãe que nos ficou da infância, com dificuldades de perceber que mudamos nós, mudaram eles.
Talvez seja por isso que eu aposto numa relação com o Rô que às vezes nem sei bem se é de mãe e filho. Somos nós dois, nos reconhecendo o tempo todo. Isso não significa deixar de cuidar dele, de mostrar a ele o certo e o errado, nem me recusar a oferecer a ele alguns contornos claros sobre o que é a vida. Significa sim um olhar atento, o reconhecimento junto com ele que de vez em quando erro, perco a cabeça, não sou perfeita, enfim. Mas estou aqui, com ele, pro que der e vier.
É tão difícil. O mais comum é se sentir desajeitado diante dos outros, tanto mais diante dos seres pequeninos que nos amam, nos olham tão de perto e esperam de nós toda certeza do mundo. Nessas horas, é mais fácil ser um papel - nos aproximarmos do que imaginamos que são as mães, os pais, e agir como se soubéssemos exatamente o que estamos fazendo. Mesmo que na maior parte das vezes não saibamos. Mesmo que vira e mexe a gente se sinta tão criança quanto o filho que espera de nós uma resposta.
Tem jeito de não ser desajeitado quando a gente contém no corpo tanto amor?
Imagem: http://familias-online.blogspot.com/2007/05/famlia-ontem-hoje-amanh-sempre.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário