13 maio, 2008

Fausto

Sábado passado estive em São José dos Campos. Além de visitar minha mãe, desta vez eu também tinha uma razão especial para estar lá: tinha sido convidada pela minha querida professora de português para ser jurada no Festival de Poesias do colégio onde estudei durante todo o colegial e do qual tenho tantas recordações.

O programa por si só rescendia a saudosismo - ir ao colégio, estar num festival de poesia (do qual participei uma única vez, para a felicidade dos jurados e do público, já que as musas da poesia nunca foram muito com a minha cara...). Mas sobretudo eu tinha um objetivo inconfesso: rever o Fausto.

O Fausto, além de ter sido meu professor de Geografia, foi principalmente meu diretor de teatro. Na verdade, ele era (e ainda é) diretor do grupo de teatro do colégio, mas nem por isso menos meu que enchia tanto a paciência dele, com minha presença insistente na porta da sala dos professores e as inúmeras cartas e bilhetes que enviava para ele (se serve de conforto, meu querido, os períodos mais intensos da minha vida estiveram marcados por essa fúria missivista, uma certa incapacidade de conter o desejo de comunicar a descoberta do mundo).

Depois de chegar ao colégio, encontrar a C., descobrir onde e o que teria que fazer, não demorou muito até ele aparecer: tão ou mais querido do que nunca. Fiquei tão feliz em vê-lo, tão feliz...que não queria mais largá-lo. Abraçá-lo foi como percorrer um longo caminho de volta.

E fiquei pensando se de vez em quando a gente não evita rever as pessoas queridas para não perceber a imensa falta que elas nos fazem. Fiquei pensando se o reencontro mais constante com quem amamos não tornaria a vida de todo dia infinitamente insuportável pois a quem interessam tantos detalhes, tantas "coisinhas" se o que vale mesmo a pena são esses momentos em que a gente se reconhece no outro, se dá conta de que temos passado, presente e futuro - cintilam um milhão de possibilidades pelo simples fato de que nos lembramos que não estamos sozinhos no mundo: estão lá aqueles olhos, aqueles braços, aquela presença que significa estar em casa.

Na crônica "Pequenas Epifanias", o Caio Fernando Abreu diz da felicidade lançada sobre a vida por instantes em que relampeja uma possibilidade de amor - a esperança que se incorpora a nós e nos torna menos sós...Faz como o amor pro João Cabral, nos "Três mal-amados" - come a fome, a dor-de-cabeça e o medo da morte.

Reencontrar o Fausto sem dúvida significou para mim uma pequena epifania - a possibilidade de ter história, de estar marcada pela existência de alguém, de ter construído vínculos tão fortes, tão fortes que sobrevivem ao tempo, à distância e à ausência.

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