05 maio, 2008

Meu pai

Meu pai é desajeitado. Sempre me lembro dele assim. E um desajeito que não tem nada a ver com derrubar as coisas, quebrar copos ou pratos: é um desajeito para a vida e principalmente para o amor.

É raro falar dele - mas quando falo, sou obrigada a reconhecer o quanto o carrego dentro de mim: o orgulho de menina sentada na mesa do bar com ele; a pequeninice da minha própria voz cantando O Caderno em um dueto com ele; o desconcerto em vê-lo chorando quando lhe mostrei meus brincos novos.

Meu pai, gaúcho que nunca se achou em outro lugar, menino que nunca se achou em outra idade, homem que nunca se achou com mulher nenhuma. Meu pai é desajeitado. Mas mesmo há tanto tempo sem vê-lo, a coleção de cacos das pequenas lembranças que tenho dele resta intacta dentro de mim. É uma ausência que espeta, machuca, de vez em quando rasga: mas não a troco por nada-nada-nada.

* Eu realmente quase nunca falo sobre o meu pai. Não por falta de amor, mas porque não nos vemos há muito tempo e é mais fácil viver sem lembrar o tempo todo dessa distância. Mas o Carpinejar acaba de lançar uma reedição revista de Um terno de pássaros ao sul e lançou um desafio lá no blog dele, premiando quem escrever a lembrança mais tocante sobre o pai com o livro, autografado por ele. Então resolvi tentar escrever um bocadinho sobre o meu pai; não para ganhar o livro, mas para lembrar mesmo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário