de uma conversa muito antiga com ele, sobre magia, linguagem e ação:
"Eu tenho à medida que designo - e este é o esplendor
de se ter uma linguagem. Mas eu tenho muito mais à medida que não consigo
designar. A realidade é a matéria-prima, a linguagem é o modo como vou buscá-la
- e como não acho. Mas é do buscar e não achar que nasce o que eu não conhecia,
e que instantaneamente reconheço. A linguagem é o meu esforço humano. Por
destino tenho que ir buscar e por destino volto com as mão vazias. Mas - volto
com o indizível. O indizível só me poderá ser dado através do fracasso de minha
linguagem. Só quando falha a construção, é que obtenho o que ela não conseguiu.
E é inútil procurar encurtar o caminho e querer começar já sabendo que a voz
diz pouco, já começando por ser despessoal. Pois existe a trajetória, e a
trajetória não é apenas um modo de ir. A trajetória somos nós mesmos. Em
matéria de viver nunca se pode chegar antes. A via-crucis não é um descaminho,
é a passagem única, não se chega senão através dela e com ela. A insistência é
o nosso esforço, a desistência é o prêmio. A este só se chega quando se
experimentou o poder de construir, e, apesar do gosto de poder, prefere-se a
desistência. A desistência tem que ser uma escolha. Desistir é a escolha mais
sagrada de uma vida. Desistir é o verdadeiro instante humano. E só esta é a
glória própria de minha condição. A desistência é uma revelação." (Clarice
Lispector, na Paixão segundo G.H.).
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