30 junho, 2010

A Toy Story

Não, não vou falar do filme. (A gente até foi ver no fim de semana de estréia e eu tinha pensado em escrever a respeito já que o curta é lindo, o filme é muito bom, eu chorei em bicas, o Buzz Lightyear é a melhor personagem ever... Mas acho que perdi o momento oportuno e agora fiquei vazia de vontade de falar do assunto). Então, retomando, não é sobre o filme que vou escrever, mas sobre o brinquedo predileto do Rodrigo: o Amigão.

Desde que o Rodrigo tinha um ano, ele adora um boneco de pano que herdou da minha sobrinha - uma espécie de travesseirinho, com roupa xadrez e mãozinhas e perninhas mamolengas. Já falei dele algumas vezes, porque foi devido ao Amigão que acabei me aventurando no mundo da costura, e, como uma coisa leva a outra, foi por causa dele que aprendi a fazer softies variados, comecei a fazer barras de calças em casa e, por tudo isso, até ganhei uma máquina de costura de presente da minha avó. É que, volta e meia, a roupa do Amigão tinha que ser refeita e aí, nessa de praticamente costurar um novo Amigão, acabei tomando gosto pela coisa.

O Amigão já viveu várias aventuras. Como o Rodrigo não dorme sem ele, já rolou lavá-lo e em seguida secá-lo no forno (e já rolou também de eu, atrapalhada, errar na regulagem do forno e queimar todo o forro do bichinho - e dá-lhe costurar um novo forro!); já rolou esquecê-lo na casa de um amigo ou na padaria;  já houve tentativas de substituição, sempre frustradas... E o Amigão já foi muitas vezes à escola, ao parque, ao cinema. Até na médica ele ia junto, para ser pesado e medido, cuidador zeloso que o Rodrigo é.

O Amigão é o companheiro-mor do Rô: já foi lenço, já foi saco de pancadas; é companhia na hora de dormir; é com quem ele aprende a ser pai; é com quem ele aprende a respeitar os limites do outro, menorzinho, mais frágil (vira e mexe ele vinha me explicar as razões pelas quais o Amigão não podia fazer certas coisas, por ser pequeninho, por ser neném...).

Imaginem então vocês o susto que tomamos ontem, depois de voltar da visita à médica (e o Amigão continuava pesando seus 100 gramas!), e constatarmos que o Amigão não estava. Procura dali, procura daqui, refaz mentalmente os passos, liga pro supermercado onde paramos para beber água, liga na companhia de ônibus e nada de Amigão.

Meu coração doído ao ver os esforços do Rodrigo em conter o desespero. "Acho que ele caiu na rua, mãe!"; "Acho que ele está triste e sozinho"... Pior mesmo quando ele me confidenciou: "mas mãe, eu sei o cheiro dele"!

E não é mesmo absurdo que possa desaparecer no mundo aquele pedacinho de coisa que a gente ama a ponto de conhecer os detalhes, de saber de cor o cheiro? Não é da memória desse convívio intenso e cotidiano que a saudade é feita?

Choramos, lembramos, nos doemos. E ele me pediu para fazer um novo Amigão. E eu, tão triste quanto ele, fui fazer. Montei a máquina, cortei os panos, costurei os pedaços. Ficou a cara do antigo. Mas não era o antigo. Na hora de desenhar os olhos, a boca e o nariz, Rodrigo se lembrou do detalhe: "mãe, ele tinha uma coisinha assim no nariz", um pequeno restinho do traço que fez o círculo; fizemos igual. Mas não era o mesmo Amigão - não tinha vivido com o Rô tudo o que o velho viveu, não tinha o mesmo peso, nem o mesmo cheiro.

Rodrigo dormiu agarrado ao novo Amigão e ao fiapinho de esperança que tivéssemos esquecido no ônibus e hoje estivesse nos Achados e Perdidos. Fiapinho frágil, eu sabia, o que só me dava mais tristeza de antecipar a frustração mais uma vez.

"Tomara que alguma criança boazinha o encontre e cuide bem dele", era o que eu pensava. É que também me afligia pensar no Amigão abandonado em alguma calçada ou, pior ainda, jogado no lixo. Coisas que carregam tanto amor não deviam sumir assim.

Às dez ligamos novamente na empresa de ônibus. Infelizmente, só sacolinhas, casacos e muitos documentos. Rodrigo chorou de novo.

Quando comecei a escrever esse post, o final da história era triste: Amigão desaparecido no mundo, nós com saudade, lamentando a perda.

Mas eis que, descendo para encontrar o Edu, esperávamos na calçada e, de repente,  o Rodrigo me puxa e aponta: "olha, mãe, é o Amigão!". Atordoada, olho pro chão e vejo o Amigão, ensopado, sujo, atropelado... Mas lá. Era ele mesmo. Feliz, peguei o bichinho que agora está na máquina de lavar, tomando um merecido banho.
Não sei onde o perdemos, talvez tenha sido mesmo logo aqui, no portão de casa. Mas a meninice dentro de mim me sussurra que não - que o perdemos mais longe, e que ele aproveitou a noite escura para vir andando até aqui, com suas perninhas malemolengas, seu corpinho que nem pára em pé e, sobretudo, com o amor imenso que ele tem pelo Rodrigo - cujo nome está impresso na costura de sua roupinha.

É bobagem, eu sei. Mas o retorno do Amigão me renovou a fé e a esperança. Na vida. No encontro. No amor.

(E talvez, falando do Amigão, eu esteja afinal também falando do filme...).

11 comentários:

  1. Até eu já estava chorando, Bi! Mas nada como um final feliz, desses que até parecem de filme! Renova mesmo as nossas esperanças, de que há mais na vida do que apenas isso que a gente vive todo dia, que há momentos que interrompem tudo e fazem o resto ganhar sentido e valer a pena.

    Beijocas!

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  2. Olá Fabiana, encontrei seu blog por meio do Come-se, que sou fã.E me vi encantanda com tanta sabedoria e doçura com as palavras. Parece que você tem mais intimidade com elas, e isso passa para a gente...Amei cada texto que li. Mas, o melhor é que tenho um menino, Lucas, que vive muitas histórias parecidas com as do seu. Esse final de semana fiu com ele ao cinema assistir Toy Story, e também chorei...Me senti meio tonta, ali chorando em um filme infantil, mas emfim, me emocionei. E agora, novamente, tive essa emoção. Lindo texto! Fico feliz que vocês tenham encontrado o Amigão, ou que ele tenha encontrado vocês...Beijo em você e no Rodrigo.

    Silvia Vieira

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  3. O melhor post ever. Não consigo parar de chorar, de rir, de dar graças.
    Te amo.
    Beijão

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  4. Fabiana, vou confessar que por ter blog de beleza normalmente acabo visitando os que tb o são, quando por acaso me deparei com o seu e ia deixando pra lá..mas minha curiosidade foi muito maior, AINDA BEM, porque amei! To com lágrimas nos olhos e vontade de apertar vc, o seu filhote e o "Amigão" rs..imagina uma pisciana lendo essa história..não podia ser diferente! Parabéns!
    Bjocas Vanessa Nedel
    divadabeleza.blogspot.com

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  5. Oi Fa, fico feliz que tenham achado o Amigão. Também já estava aqui com lágrimas nos olhos com o ocorrido. Suas palavras finais são sábias. São fatos como estes, que você relatou tão bem, que nos fazem acreditar que a vida é boa. Beijos, da sua mãe.

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  6. Queridos, obrigadas a todos pelo carinho. Rodrigo dormiu abraçado aos dois Amigões - o velho, já limpinho e seco no forno e o novo, que não tem nem bem 24 horas e já virou símbolo de uma aventura que, felizmente, acabou bem. Ele só fala em contar para os amigos da escola toda essa saga :-)
    Beijos!

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  7. PARABÉNS, LINDOS SENTIMENTOS,
    AMOR INCONDICIONAL POR TUDO, ISSO É MARAVILHOSO!
    ACHEI SEU BLOG SEM QUERER, CLICANDO NO PRÓXIMO BLOG.
    TB TENHO UM, drikpekler.spaces.live.com/blog
    UM ABRAÇO
    ADRIANA

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  8. Ai, Fa, acabei de falar pro meu pai (e imagino que ele já tenha te dito), mas fui ver o Toy Story na 5a e fiquei passando mal, lembrando do Amigão. Que bom que ele apareceu. Imagina as aventuras que ele deve ter para contar...

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    1. Oi bia �� to no celular �� e sou o rodrigo no celular �� da mãe��

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  9. Bia, seu pai não tinha me contado a parte de que você foi ver o filme, não... Mas é de passar mal, né? Quando eu era pequena eu bem achava que meus brinquedos ganhavam vida, mas a Pixar dotou a fantasia de mais uma porção de detalhes e nuances...
    Aparentemente, Amigão tem sussurrado pedacinhos de suas aventuras no ouvido do Rodrigo. Mas só o "original"; o "novo" ainda não aprendeu a falar :-) Beijocas.

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