12 agosto, 2009

Cada coisa em seu lugar


A casa andou tão abandonada, tanta coisa a ser limpa ou jogada fora, e eu não tinha tido tempo de colocar as coisas no lugar. Na semana passada, finalmente, roubei tempo e consegui: arrumar as estantes dos livros de literatura, pôr ordem no escritório, colocar os textos em pastas, as canetas nos potes, os lápis nas caixas, os pingos nos is. Arrumar por fora, pra ver se o por dentro também encontra alguma ordem.

O corpo cansado e doído, mas recheado de cintilâncias, porque colocar colocar a casa em ordem é quase escavar as diversas camadas de amor que foram se depositando nas estantes e por toda a casa que é nossa: sete anos de vida em comum e nossos começos estão na dedicatória linda que você me escreveu no livro da Adélia Prado; nas mensagens que a gente trocava tão intensamente, até antes do começo (ou vai ver que começou aí, nas palavras cotidianas com as quais a gente se tateou antes mesmo que a paixão nos tomasse); o amor está parafusado, colado e pintado nas coisas que inventamos e construímos para que a casa ficasse mais bonita e com a nossa cara; está nas coisas que sonhamos, escolhemos e compramos juntos; está na confusão das novidades que o Rodrigo trouxe - e arrumar a casa é sempre arrumar também mais espaço para esse nosso filho que não pára de crescer.

Arrumar a casa, nessas arrumações "sérias", só dá pra fazer com muito tempo disponível para aproveitar a paisagem. Tem que ser sem pressa, para que seja possível parar a cada bilhete perdido reencontrado, a cada grifo esquecido no livro predileto, a cada sorriso de surpresa ou saudade.

Sei que você não entende direito, por isso é que venho aqui te explicar: eu arrumo a casa pra passar pano úmido por dentro de mim, pra recolher cada pedacinho e poeirinha desse nosso amor, pra evitar que ele se desgaste, pra nos reencontrar. E, assim, relembrar a certeza boa de quando te conheci e entendi que meu lugar é aqui: do teu lado.

Imagem: Alicia

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