é a música que toca em Pontes de Madison, num radinho de pilha que faz a voz de Billie Holiday vir direto do passado. é uma música linda, que fala de urgência e de presente. por causa dela, paguei o preço mais caro num cd importado, apenas para para descobrir que a versão era diferente é que não era nem de longe tão bonita quanto essa. uns anos depois, a supresa: a música nessa versão, encontrada numa banquinha das Americanas por R$7,90. o misterioso sentido de justiça do universo.
o Zizek não gosta das Pontes de Madison. acho que é o Zizek, posso ter me confundido. mas não, não me confundi: ao falar da relação entre o indivíduo e um Outro (outra pessoa, uma instituição, o Estado...) que sabe, Zizek comenta sobre a reversão final de A era da inocência e pensa se essa não seria uma forma de redimir As Pontes de Madison: que ao fim do filme ficássemos sabendo que o marido, simplório e caipira, sempre soube do que ocorreu entre ela e o fotógrafo:
[...] Esse é o enigma do conhecimento: como é possível que toda a economia psiquíca de uma situação se altere radicalmente, não quando o herói fica sabendo diretamente de algo (um segredo há muito reprimido), mas quando ele é informado de que o outro (que ele imaginava ignorar) também sabia o tempo todo e só fingia não saber para manter as aparências - existe coisa mais humilhante que a situação de um marido que, depois de um longo caso secreto de amor, fica sabendo de repente que sua mulher sabia de tudo há muito tempo, mas guardou segredo por educação ou, o que é pior, por amor a ele?" (Slavoj Zizek, Bem vindo ao deserto do real. São Paulo: Boitempo, 2003, p.83).
(o texto é sobre outra coisa - é sobre a fantasia totalitária de poupar os indivíduos de toda dor, inclusive a de saber que o outro sabe algo que ele próprio não deve saber, justamente para não sofrer. mas não há possibilidade ética de prevenção de todo o sofrimento e de toda dor, porque é esse mesmo pressuposto que está equivocado na medida em que ele é oposto à ideia de vida).
(para partir é preciso coragem; para ficar, também. mas partir também pode ser covardia; e ficar, também).
[...] Esse é o enigma do conhecimento: como é possível que toda a economia psiquíca de uma situação se altere radicalmente, não quando o herói fica sabendo diretamente de algo (um segredo há muito reprimido), mas quando ele é informado de que o outro (que ele imaginava ignorar) também sabia o tempo todo e só fingia não saber para manter as aparências - existe coisa mais humilhante que a situação de um marido que, depois de um longo caso secreto de amor, fica sabendo de repente que sua mulher sabia de tudo há muito tempo, mas guardou segredo por educação ou, o que é pior, por amor a ele?" (Slavoj Zizek, Bem vindo ao deserto do real. São Paulo: Boitempo, 2003, p.83).
(o texto é sobre outra coisa - é sobre a fantasia totalitária de poupar os indivíduos de toda dor, inclusive a de saber que o outro sabe algo que ele próprio não deve saber, justamente para não sofrer. mas não há possibilidade ética de prevenção de todo o sofrimento e de toda dor, porque é esse mesmo pressuposto que está equivocado na medida em que ele é oposto à ideia de vida).
(para partir é preciso coragem; para ficar, também. mas partir também pode ser covardia; e ficar, também).
mesmo antes de casar, no fim do filme eu também me agarrava à porta do carro como a uma certeza puída, e molhava o mundo com as minhas dúvidas. esperando que dessa vez a mulher criasse pernas para ir embora. esperando que dessa vez o nó atado doesse menos ao se apertar tão firme. a fita vhs que a Ana me deu, porém, teimando em permanências.
So love me tonight
Tomorrow was made for some
Tomorrow may never come
For all we know
o Zizek tem razão. o Clint Eastwood também:
não tem forma pra tanta contradição.
e uma rima nunca é uma solução.
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