08 março, 2009

De carne e osso

Sempre me disseram que eu era romântica demais, sonhadora demais, muito idealista, que andava com a cabeça nas nuvens... De modo que por bastante tempo eu achava que não levava jeito pra viver. Pelo menos não essa vida de todo dia, os milhões de tarefinhas e pequenas chateações que a gente toma como medida de virar gente grande. Eu achava, do ponto de vista de quem sonha, que dava pra vida ser outra coisa.

Apesar disso - ou por isso mesmo - aprendi a ser organizada e pragmática, a não planejar ou esperar demais, enfim, a deixar espaço pro imprevisível da vida. Por isso não me via refletida nessa imagem do romantismo excessivo: quer coisa mais real do que o imprevisível?

E de imprevisível em imprevisível, conciliando projetos de prazo maior ou menor com paixões arrebatadoras, cá estou. Não sei se perto ou longe do que tinha sonhado pra mim porque no meio do caminho houve (e há) o desejo, e o desejo faz do sonho um barro ao qual a gente dá nova forma. Não tenho um ideal para atingir; pra mim me basta me sentir confortável debaixo da minha pele.

Não o clímax irrepetível dos grandes acontecimentos, mas a coleção de pequenas e grandes alegrias. Um olhar tão intenso que se imprimiu no corpo indelevelmente. A mão que relembra o calor da primeira vez que procurou abrigo na do outro. Os ouvidos que ecoam o som da gargalhada distraída do filho assistindo TV. Chegar à noite e perceber que mais um dia passou, sem grandes sobressaltos, mas pleno da graça de termos sobrevivido juntos a ele. As alegrias espalhadas por dentro do corpo, bolhas frágeis de sabão, tão frágeis quanto a gente mesmo que dói e goza porque é de carne e osso.

* Para ilustrar o imprevisível bonito da vida, tinha dado o nome ao post e estava escrevendo quando me lembrei de uma música da Zelia Duncan que, em uma época, ouvia e cantava como um mantra: "Estou me acostumando comigo/ revendo a casa, os vizinhos/ e os vazamentos e isso já não me assusta mais...". Eis que, procurando pelo arquivo para colocar aqui, descobri uma música da Zelia Duncan chamada..."carne e osso"! E que tem tudo a ver com as razões e sentimentos desse post, já que decidi escrever depois de ler a Renata e sua pequena ode à felicidade que não seja de plástico. É por essas que, às vezes, a gente consegue se sentir protegido, mesmo que no interior de uma bolha de sabão.



Um comentário:

  1. Oi, Fabiana. Te leio tem tempo, e já te citei algumas vezes. Devidamente creditadas, diga-se.
    Mas hoje, especialmente hoje, menina... Disseste TUDO o que eu queria dizer. Espero que não te ofendas com a citação expandida. :)

    Um abraço,
    Ana

    (http://anaband.spaces.live.com)

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