sentada na biblioteca silenciosa, experimenta o livro com cuidado. o índice, o texto desejado. é só depois de levar o livro para casa, porém, que ao acaso abre o volume do avesso - a quarta capa confundida com a primeira. e então a surpresa: demora a perceber que a letra caprichada não é impressa - o esmero camuflando a subversão. mas se a forma engana, o texto não deixa dúvidas: rabanada e pudim de natal. o cheiro de ambos sobe dentre as páginas, assim como o desterro das festas de trabalho minorado pela delícia das comidas, das companhias, dos novos sabores. na pressa, retira da bolsa o único papel possível: a brancura da página final quase um novo presente de natal. sem pressa, anota a receita, devagar, saboreando em cada torneio da caneta o doce dos quitutes natalinos. o gosto inaugura lembranças, como aquela festa inaugura vida nova. nascer, renascer. a dureza do texto acadêmico afrouxando no vestígio de vida. é sobre o trabalho de pesquisa e sobre cotidiano o livro - e a receita quase impressa, misturando-se aos outros caracteres, ilustrando o momento em que o uso fez do livro outra coisa: improviso de caderno, inscrição urgente do momento que um desejo quis preservar.
Se te pareço noturna e imperfeita/ Olha-me de novo. Porque esta noite/ Olhei-me a mim, como se tu me/ olhasses. E era como se a água Desejasse/ Escapar de sua casa que é o rio / E deslizando apenas, nem tocar a margem. Te olhei. E há tanto tempo/ Entendo que sou terra. (Hilda Hilst)
21 maio, 2012
urgência
sentada na biblioteca silenciosa, experimenta o livro com cuidado. o índice, o texto desejado. é só depois de levar o livro para casa, porém, que ao acaso abre o volume do avesso - a quarta capa confundida com a primeira. e então a surpresa: demora a perceber que a letra caprichada não é impressa - o esmero camuflando a subversão. mas se a forma engana, o texto não deixa dúvidas: rabanada e pudim de natal. o cheiro de ambos sobe dentre as páginas, assim como o desterro das festas de trabalho minorado pela delícia das comidas, das companhias, dos novos sabores. na pressa, retira da bolsa o único papel possível: a brancura da página final quase um novo presente de natal. sem pressa, anota a receita, devagar, saboreando em cada torneio da caneta o doce dos quitutes natalinos. o gosto inaugura lembranças, como aquela festa inaugura vida nova. nascer, renascer. a dureza do texto acadêmico afrouxando no vestígio de vida. é sobre o trabalho de pesquisa e sobre cotidiano o livro - e a receita quase impressa, misturando-se aos outros caracteres, ilustrando o momento em que o uso fez do livro outra coisa: improviso de caderno, inscrição urgente do momento que um desejo quis preservar.
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são muitos os livros que escondem receitas e aromas de baunilha ou sardinha. algumas mais urgentes, outras apenas subentendidas. beijo.
ResponderExcluirpois é, v. achei tanta coincidência encontrar uma receita, assim, no final de um livro de trabalho... ainda mais depois do seu pequeno conto doce, com cheiro de brigadeiro. tô achando um sinal dos céus para a gente levar a cabo aquela sua ideia :-) Beijos!
ResponderExcluirentão, só falta comentar o tema do tal livro e arranjar em letras mais legíveis as duas receitas aí de cima. coisa pouca. sem corrente já temos várias: uma sua, outra minha e as mil e uma histórias com receitas da neide ;)
ResponderExcluirhá várias histórias de documentos perdidos entre capa e miolo de livro, entre capa e encapado de livro, no papel usado para encapar livros. todos fascinantes. às vezes raspo a tela do computador, mas não alcanço grandes revelações, não...
beijo.