31 maio, 2012

proximidade

a criança brincando na praça enuncia a falta com poesia: vem, mãe, aqui no meu perto! de perto, a gente atenta o momento em que a escuta rebrilha os olhos em compreensão ou turva nos lábios um sorriso. de perto, as mãos traem o nervoso mal contido e se contorcem, travando os dedos como dentes que se cerrassem duros. de perto, o perfume percorre o caminho do nariz à pele, se esparramando sem pedir licença, inaugurando memórias. de perto é ainda longe quando - tropeço que interrompe a distração - a vertigem de beira de abismo acorda o desejo de pular. na lonjura mora a saudade. no perto, habita a urgência.

30 maio, 2012

trama

abro o e-mail de manhã e uma supresa deliciosa na caixa postal - uma história, traduzida com todo carinho, dividida com esperança e alegria. devoro a história como o sr. raposo devora os livros: cheia de fome e vontade, com sal, mas sem pimenta - que não estou acostumada e a língua fica dormente, a entravar a boca pra conversa ou pra outros gostos.
e como uma boa história que a gente devora também devora a gente, no caminho de volta da escola tem mãos dadas e um novo partilhar: cada passo desenrolando a trajetória do sr. raposo, seus hábitos alimentares, seu período de fast food - forma sem conteúdo, que não sacia de jeito nenhum...; sua descoberta da biblioteca, sua carreira criminal, sua volta por cima... a cada episódio, a mãozinha quente apertando mais forte a minha e perguntando "e aí? acaba assim?". a ansiedade de conhecer o final devorando mais que a fome da hora do almoço.
a ponta lançada do outro lado do oceano amarrada à trama de cá - costurando a presença onde a saudade, ela também, insatisfeita.

21 maio, 2012

urgência


sentada na biblioteca silenciosa, experimenta o livro com cuidado. o índice, o texto desejado. é só depois de levar o livro para casa, porém, que ao acaso abre o volume do avesso - a quarta capa confundida com a primeira. e então a surpresa: demora a perceber que a letra caprichada não é impressa - o esmero camuflando a subversão. mas se a forma engana, o texto não deixa dúvidas: rabanada e pudim de natal. o cheiro de ambos sobe dentre as páginas, assim como o desterro das festas de trabalho minorado pela delícia das comidas, das companhias, dos novos sabores. na pressa, retira da bolsa o único papel possível: a brancura da página final quase um novo presente de natal. sem pressa, anota a receita, devagar, saboreando em cada torneio da caneta o doce dos quitutes natalinos. o gosto inaugura lembranças, como aquela festa inaugura vida nova. nascer, renascer. a dureza do texto acadêmico afrouxando no vestígio de vida. é sobre o trabalho de pesquisa e sobre cotidiano o livro - e a receita quase impressa, misturando-se aos outros caracteres, ilustrando o momento em que o uso fez do livro outra coisa: improviso de caderno, inscrição urgente do momento que um desejo quis preservar.

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15 maio, 2012

reticências

quando é indizível mas incarregável, a gente não devia ter forma de expressar? não devia ter um jeito pra gente falar o silêncio e preencher com vazio? se a matemática inventou o zero, a poesia não devia inventar uma figura que dissesse calando? comunicando reticências alguém soube escutar a chuva. se eu desaguar a minha angústia no teclado, alguém vai ler o que eu não soube dizer? nos vãos entre os pontos pode morar uma compreensão? não a do saber, mas ao menos da mão estendida. se eu ficar bem quietinha, você vai ouvir eu te amo?

08 maio, 2012

(parênteses adolescente)

 
Mark Ruffalo + Bruce Banner + Hulk = amor eterno

(embora, confesso, o Gavião Arqueiro do Jeremy Renner também é tudo de bom!)

Imagem: daqui.

05 maio, 2012

patamar

"Agora que você chegou
não preciso mais me roubar.
E como farei com os versos
que escrevi?"

(Ana Cristina César)